Torcedor do Boca Juniors sendo preso em flagrante após cometer atos racistas
Apesar do crescimento dos atos racistas, não há uma única pessoa presa em decorrência do crime cometido, lamenta Marcelo Carvalho, diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, veículo criado para monitorar e divulgar casos de racismo no futebol brasileiro. De acordo com um levantamento do Observatório, o futebol Sul-americano registrou recorde de casos de injúria racial em 2022. A impunidade e omissão das instituições que regulamentam as competições são determinantes para a recorrência dos casos discriminatórios.
A Confederação Sul-americana de Futebol (Conmebol), registrou, de janeiro, mês que marca o início das competições internacionais, até maio, apenas ⅓ da temporada, 9 casos de injúria racial. Segundo a instituição, os brasileiros são alvos das discriminações. Nos casos mais recentes, os argentinos dirigem insultos racistas, como sons imitando um macaco, além de gestos com as mãos, em direção às torcidas brasileiras. Atitudes como essas foram vistas em River Plate x Fortaleza e Independiente x Ceará, todos em território argentino. Os racistas, entretanto, não se intimidam em território inimigo, já que, em abril, um torcedor do Boca Junior foi preso em flagrante na Arena Corinthians, em São Paulo, por injúria racial, mas foi liberado em menos de 24 horas, após pagamento de fiança.
“Por muito tempo, um estádio de futebol foi considerado o ambiente onde as pessoas poderiam sair de casa para despejar toda sua raiva e frustração. Era normal as pessoas dizerem que é bom ir ao estádio para gritar, xingar para aliviar o estresse. Mas, dentro desse “gritar e xingar”, havia toda forma de preconceito e discriminação”, afirmou Marcelo Carvalho. “A mudança de comportamento está acontecendo, mas de forma gradual e sem uma organização. A torcida está denunciando, os jogadores estão denunciando. A questão toda fica por conta da forma como as autoridades estão tratando um caso de racismo, não dando sua devida importância”, completou.
Indagado sobre a soltura do torcedor do time argentino em São Paulo, Marco Luca Valentim, ex-lutador e jornalista da Rede Globo, líder e criador do Grupo étinico-racial da emissora, se questiona: “ O torcedor que foi detido já foi solto, porque pagou uma fiança de 3 mil reais. Por que? Porque ele foi enquadrado como injúria racial. E esse é o grande gargalo, a grande importância de uma luta de décadas dos movimentos negros do Brasil pra equiparar injúria racial a racismo. Porquê? O racismo é um crime imprescritível e inafiançável. No Brasil a maioria dos casos é enquadrada como injúria racial. E aí paga-se uma fiança ou o crime prescreve e não dá em nada. Então, quando a gente lembrar aquela frase do Kabengele Munanga que diz que o racismo no Brasil é o crime perfeito é por isso. É fácil e não dá em nada.”.
O plenário do Senado Federal aprovou, no dia 18 de maio de 2022,, um projeto de lei que pretende equiparar o crime de injúria racial ao de racismo. O decreto segue agora para análise da Câmara dos Deputados. O projeto de lei foi apresentado ainda em 2015, contudo, os deputados federais aprovaram somente em novembro de 2021. Após revisão e modificação dos senadores, a lei volta para votação na Câmara. Enquanto isso, mais casos de racismo são registrados nos estádios pela América do Sul.
O Ministério Público, por sua vez, pediu à Conmebol informações sobre medidas em casos de racismo. A Confederação sul-americana alterou o alterou o artigo do código disciplinar sobre discriminação. De acordo com a Agência Brasil, a Conmebol aumentou as multas contra os times que tiverem torcedores pegos cometendo atos racistas nos estádios e arredores. Além da possibilidade de o time atuar sem torcida, a punição mínima subiu de US$ 30 mil para US$ 100 mil (R$ 513 mil na cotação atual).
No sorteio oficial da fase eliminatório da competição mais importante do continente, Alejandro Domínguez, presidente da Conmebol, discursou contra manifestações racistas nos estádios, “Podemos torcer durante a competição, mas não podemos permitir a discriminação e muito menos o racismo. Vocês (torcedores) também são partes responsáveis pelos seus clubes. Honestamente, peço para que evitem, evitemos. Vamos jogar juntos, encher os estádios, torcer, mas não ao racismo e à discriminação”, suplicou. Em contrapartida, o presidente se esquivou sobre mais rigidez nas punições, como a perda imediata de pontos das equipes cujas torcidas cometerem atos de preconceito.
Torcedores do Boca Juniors fazendo gestos de macacos em direção à torcida do Corinthians, em São Paulo
Reportagem de Luiz Augusto Duarte
Comments